Por trás dos véus » Opinião e Notícia

TURQUIA

Por trás dos véus

Cresce a influência das mulheres na sexista política turca

Na última semana, em Istambul, 13 países europeus assinaram uma convenção do Conselho da Europa para o combate à violência contra a mulher. Todos os 47 membros foram intimados a assinar o documento. A Turquia foi um dos maiores promotores da convenção, que propõe linhas telefônicas de ajuda, abrigos e auxílio legal para mulheres vítimas de abusos.

Faz sentido. Juntamente com a Rússia, a Turquia apresenta os piores números da Europa no que diz respeito à violência contra mulheres. Segundo dados do governo, cinco mulheres foram mortas diariamente nos primeiros sete meses de 2009. Um apavorante novo relatório do Human Rights Watch sugere que a situação está piorando. Segundo o relatório, 42% das mulheres acima dos 15 anos sofreram violência física ou sexual; nem mesmo grávidas escapam dos ataques. Asli, uma mulher curda de 21 anos foi envenenada, espancada e violentada por seu marido e parentes dele, e depois foi trancada em um estábulo sem comida ou água. Ela decidiu procurar a ajuda dos promotores locais depois que seu sogro queimou seu braço e declarou que não a havia trazido apenas para seu filho, mas também para seu prazer. Mas os promotores nunca atenderam a seus pedidos, e ela agora teme por sua vida. Histórias como as de Asli são bastante comuns.

O moderadamente islamita Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AK) fez reformas até então inéditas para proteger as mulheres desde que chegou ao poder na Turquia, em 2002. As leis no entanto são inconsistentes. Mulheres solteiras, divorciadas, ou casadas unidas por casamentos islâmicos ilegais não estão protegidas. A polícia frequentemente rejeita queixas sob a alegação de que “a unidade familiar deve ser preservada”. Hulya Gulbahar, uma advogada feminista, diz que o excessivamente conservador primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan é responsável. “Seu discursos contra o divórcio e conclamações para que as mulheres tenham ao menos três filhos pioraram a situação”, afirma. A Turquia está atrasada em termos de igualdade, ocupando o 126° lugar entre 134 países no Índice Global de Desigualdade Sexual. Outro estudo diz que as mulheres representam 4/5 dos 5,7 milhões de analfabetos da Turquia.

Próximas eleições

Tudo isso deve dar munição à oposição nas campanhas para a eleição geral, marcada para o dia 12 de junho. Na verdade, as raras menções a mulheres na campanha dizem respeito a cenas disponibilizadas na internet mostrando candidatos do Partido da Ação Nacionalista (MHP) filmados secretamente em situações comprometedoras. A boa notícia é que o número de mulheres eleitas para o Parlamento deve dobrar, e chegar a 18%. Mas a Turquia permanecerá atrás de outros países muçulmanos, como o Afeganistão (28%) e os Emirados Árabes (23%).

Outra boa notícia é que as mulheres estão se organizando. Aquelas lutando para dar um fim às restrições sobre o uso do véu estão entre as mais ativas. Mulheres seculares apoiam a campanha para forçar os partidos a aceitarem que candidatas cubram suas cabeças. “Sem véu, sem voto”, é seu slogan.

Embora Erdogan e boa parte de sua equipe sejam casados com mulheres que usam os véus, o AK indicou apenas uma usuária do véu, para um cargo inconquistável. A desculpa de Erdogan é a de que seu partido quase foi banido em 2008 por seus esforços para reverter a proibição ao véu. Um colunista pró-AK, Ali Bulac, enfureceu seus leitores quando sugeriu que mulheres com véus seriam “espiãs” agindo em nome dos secularistas ou explorando o risco para avançarem em suas carreiras. “Você preferia que estivéssemos em casa lavando suas meias”, respondeu Nihal Bengisu Karaca uma colunista (e usuária do véu) na linha de frente da campanha. Acabará ela votando inevitavelmente no AK? “De jeito nenhum”, diz ela.